Drauzio - Você acha que um dia aparecerá uma droga cujo mecanismo de ação se encarregue de nos deixar felizes sem provocar malefícios no cérebro?
Ronaldo Laranjeira –Não acredito. Fica difícil imaginar uma droga que aja só no centro de prazer sem perturbar os demais mecanismos bioquímicos do cérebro que é um órgão complexo e evolutivamente preparado para vivenciar muitas formas de prazeres sutis. Para tais estímulos, está aparelhado. Para os advindos das drogas, não.
Drauzio – Você não acha que o homem está sempre à procura do prazer total?
Ronaldo Laranjeira – A busca do prazer é uma característica positiva do ser humano. No caso das drogas, porém, ao querer superar a própria biologia por um artifício grosseiro, ele acaba se empobrecendo. O desejo de intensificar o prazer ao máximo empurra o homem para uma guerra que jamais será vencida.
Campanhas contra as Drogas
Drauzio – Quando analisamos as campanhas contra as drogas, verificamos que se baseiam muito nos aspectos negativos dessas substâncias. A idéia é sempre assustar o usuário: “droga mata”. Aí, o garoto fuma uma baseado e não morre. Ao contrário, sente-se bem e fica achando que tudo não passa de uma grande mentira. Você acha que o enfoque das campanhas é ingênuo?
Ronaldo Laranjeira – Estamos ainda muito no começo. Na criação de um modelo do que acontece com os usuários de droga, as campanhas estão numa fase bastante embrionária, mas acho que estão certas ao afirmar que drogas fazem mal. Ficar só nisso, porém, é passar uma informação de saúde ingênua e pobre. É preciso dizer como e por que as drogas são altamente prejudiciais ao organismo para que a pessoa tome uma decisão firme, bem alicerçada, e disponha-se a abandoná-las.
As evidências nos mostram que, quando se trabalha com a prevenção, a prioridade deve ser dada aos fatores de risco. Todavia, a partir do momento em que já está instalado o consumo (maconha, nos casos mais comuns), as estratégias teriam de ser bem diferentes.
Orientação dos Pais
Drauzio – Muitas vezes os pais ficam apavorados quando encontram maconha nas coisas dos filhos. Como você orienta quem vive esse problema?
Ronaldo Laranjeira –Na verdade, maconha é a primeira droga ilícita que a pessoa consome, mas antes disso, em geral, já experimentou álcool e cigarro. Já não se discute mais que, quanto mais cedo o adolescente tem contato com a droga, maior a probabilidade de “escalar”, isto é, de partir para outras drogas ou intensificar o uso da maconha. É muito difícil prever quem vai ou não embarcar nesse processo. Sabe-se, porém, que quantos mais amigos envolvidos com drogas ele tiver, maior risco correrá do uso tornar-se crônico.
O primeiro passo para enfrentar a situação é os pais se informarem sobre o que está acontecendo na vida dos filhos e voltarem a exercer controle mais efetivo sobre suas atividades. Em geral, esse problema reflete uma certa crise familiar. Por razões diversas, pais e filhos se distanciaram. Por isso, a estratégia básica é levar ao conhecimento dos pais o que está acontecendo com seus filhos e os riscos que eles correm.
Quanto ao adolescente, é complicado conversar sobre esses riscos. A tendência do jovem que já se envolveu com maconha é minimizá-los ao máximo. “Que mal existe em fumar um baseado por semana?” é a pergunta que muitos fazem. Acontece que, na maioria das vezes, quem começou precocemente, no espaço de seis meses, estará fumando um baseado por dia.
Na entrevista clínica, não dá para antever o caminho que cada um percorrerá no mundo das drogas. Quem já teve o desprazer de acompanhar um adolescente numa entrevista, tranqüilizar os pais, dizendo – “Olhem, ele só está usando uma vez por semana. Essa é uma experiência pela qual ele deve passar.” – e, depois de dois anos, ver esse jovem totalmente deteriorado, traficando drogas, fica muito preocupado com o momento certo em que deve interferir. Esse é o desespero dos pais e o dilema dos profissionais. Agir na medida exata da necessidade de cada caso. Nem todos precisam de tratamento, mas não se pode deixar escapar aqueles para os quais o acompanhamento clínico é indispensável.
Drauzio – Em que você se baseia para julgar se um garoto, que afirma fumar maconha a cada dois meses , representa risco de tornar-se um usuário crônico?
Ronaldo Laranjeira – É preciso estar atento a três fatores que combinados são sinais de alerta e requerem algum tipo de acompanhamento. O primeiro é atitude por demais tranqüila do adolescente que considera a maconha inofensiva e destituída de inconveniências. Depois, é importante considerar a rede social em que está inserido. Os amigos com quem convive são usuários da droga? Por último, deve-se avaliar seu desempenho nas atividades cotidianas. É o caso do bom aluno até os 13 anos, que foi perdendo o interesse pela escola e não reage mesmo diante da ameaça de perder o ano.
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