Matéria dividida em 9 postagens – nos dias 05, 07, 10, 12, 14, 17, 19, 21 e 24 de Outubro
Por Pierangelo Garzia - Revista Mente & Cérebro n° 220, maio/2011, págs. 28 a 35
Grande parte deles tem revelado que a fé e o exercício da espiritualidade podem estimular habilidades mentais capazes de melhorar a saúde. O Psiquiatra Harold Koening, diretor do Centro de Religião, Espiritualidade e Saúde da Universidade Duke, nos Estados Unidos, chegou a mapear 700 pesquisas sobre o tema. Cerca de 500 trabalhos apontavam ligações entre crença religiosa e bem-estar físico. Entrevistados que afirmaram acreditar em “uma força maior” apresentaram, em média, melhor função imunológica, níveis mais baixos de colesterol, boa qualidade do sono e menor pressão arterial em comparação aos que se declararam céticos. Koening destaca os resultados de dois estudos prospectivos sobre longevidade (que envolveram acompanhamento 23 anos e 31 anos, respectivamente, após o início da pesquisa); pessoas que exercem uma prática religiosa regular vivem em média sete anos mais – efeito semelhante ao de não fumar sobre a expectativa de vida.
A religiosidade também tem grande influência sobre as decisões dos pacientes que enfrentam tratamentos de saúde complicados. O Journal of Clinical Oncology publicou em julho do ano passado um estudo realizado com 100 pacientes com câncer de pulmão em estado avançado, seus parentes próximos e 257 oncologistas. Os pesquisadores pediram aos participantes para classificar, em ordem de importância, sete fatores que poderiam influenciar sua decisão de enfrentar a quimioterapia, considerando toas as incertezas e desconfortos do tratamento: recomendação do oncologista, fé em Deus, eficiência do procedimento para curar a doença, efeitos colaterais, recomendação do médica da família, pedido do cônjuge, pedido dos filhos. Os três grupos (pacientes, família e médicos) classificaram a recomendação do oncologista como mais importante. No entanto, enquanto os dois primeiros colocaram a fé em Deus em segundo lugar, os oncologistas consideraram esse quesito o menos importante. Esse estudo sugere que os profissionais de saúde muitas vezes subestimam o papel que a religiosidade tem sobre a postura dos pacientes.
O curioso, porém, é que a própria medicina e os processos terapêuticos têm raízes na magia e na religião. Os xamãs, os reis taumaturgos e os santos – como Cosme e Damião, os chamados “gêmeos curadores” – são os “antepassados” dos clínicos atuais. Os hospitais da Idade Média, inicialmente concebidos como refúgios para idosos, peregrinos e enfermos, eram construídos e administrados por religiosos. A prática de cultivar, conservar e estudar as propriedades medicinais das ervas (que deu origem à atual farmacologia) teve início nos mosteiros. Mulheres que desenvolveriam essa sabedoria, fugindo ao controle da Igreja Católica, eram consideras bruxas perigosas – seu saber era ameaçador. Afinal, a habilidade de aliviar sofrimentos conferia poder. O ato de cuidar e, em especial, de curar sempre foi considerado divino, sobrenatural, mágico – haja vista o prestígio que os médicos ainda detêm.
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