Matéria dividida em 9 postagens – nos dias 05, 07, 10, 12, 14, 17, 19, 21 e 24 de Outubro
Por Pierangelo Garzia - Revista Mente & Cérebro n° 220, maio/2011, págs. 28 a 35
Não raro, mesmo nos dias de hoje, ao ter de passar por intervenções clínicas é comum que pacientes e seus familiares – mesmo aqueles que não seguem uma religião específica – recorram a orações. Não por acaso a prece terem sido foco de muitas pesquisas sobre saúde e espiritualidade. Embora até o momento não tenha sido constatada uma relação comprovadamente inequívoca entre “orações por intercessão” (feitas por um grupo religioso para uma pessoa em especial e recuperação da saúde, a possibilidade de que haja efeito psicológico benéfico na prece parece bastante provável. As pesquisas de Koening indicam que a prática costuma trazer sensação de bem-estar, confiança e relaxamento. Ele acredita que o ato de rezar estimula mecanismos sutis do psiquismo que, se forem compreendidos mais a fundo, poderiam adquirir grande importância no tratamento das enfermidades. Em um estudo com 337 pacientes que estavam internados nos setores de clínica geral, cardiologia e neurologia do centro médico da Universidade Duke, quase 90% contaram que rezavam. Mas de 40% consideravam a fé como a principal fonte e conforto, esperança e significado, o que lhes oferecia melhores condições para enfrentar a doença. Esse ponto de vista foi ainda mais expressivo entre pacientes com doenças crônicas ou em estado considerado terminal.
Entretanto, na contramão dos indícios dos benefícios da crença espiritual, um estudo publicado no The American Heart Journal em 2006 sugere até que as preces podem, em alguns casos, afetar pacientes de maneira negativa. Conduzido pelo cardiologista Herbert Benson, do Mind Body Institute da Universidade Harvard, o trabalho durou dez anos, durantes os quais foram avaliados 1.800 pacientes que passaram por cirurgias cardíacas em hospitais americanos. Eles foram divididos em três grupos: os integrantes do primeiro sabiam que pessoas rezavam por eles; outro grupo recebia as preces sem saber, e os participantes do último grupo, de controle, não tinham pessoas orando por sua saúde. Voluntários de congregações cristãs direcionavam (usando os prenomes dos pacientes e as iniciais dos seus sobrenomes) a prece “por uma cirurgia bem-sucedida com uma recuperação rápida, saudável e sem complicações”. Ao fim do experimento, os pesquisadores compararam os resultados dos três grupos e não detectaram diferenças na recuperação dos pacientes. Observaram, porém, que os que sabiam que receberiam orações tiveram mais complicações pós-operatórias, como arritmias cardíacas. Segundo os pesquisadores, essa reação pode ter sido causada não pelos efeitos da prece em si, mas pela ansiedade e expectativa de uma melhora rápida favorecida pelas orações.
Ao longo da história, cientistas, teólogos e pessoas comuns se perguntaram o que pode ser definido como “milagroso”. Segundo o geneticista Massimo Pigliucci, da Universidade Stony Brook, nos Estados Unidos, podemos chamar de milagre, por exemplo, casos de pacientes terminais de câncer que, apesar do prognóstico de poucos meses de vida, conseguem viver em boas condições por vários anos. Tais registros, no entanto, são bastante raros. “Essas estatísticas são feitas com base em grandes populações de pacientes: sobreviver além da média simplesmente significa que, por uma série de motivos complexos, como idade, estado geral de saúde, genética, pura sorte ou qualquer fator que nossa ciência ainda não consegue supor, a posição na curva que descreve a mortalidade causada por uma doença simplesmente se desvia da média, afirma Pigliucci.
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